Vitor Matos
Memórias da minha Infância
Porventura os traços que caracterizam a minha cozinha seriam diferentes se fosse outra a minha história, se outras fossem as memórias e as vivências do passado.
Filho de emigrantes, apaixonado pelo meu país de que tive de me separar muito cedo, durante a infância e adolescência sempre desenvolvi sentimentos ambivalentes. Por um lado as saudades da pequena aldeia onde nasci, por outro o fascínio por um mundo novo.
Quem já passou por uma separação desta natureza percebe do que falo. Quando estamos fora, o tempo ganha outra dimensão, os dias são mais longos e tem uma cadência diferente, as memórias são mais vivas e revoltas, o coração está sempre apertadinho e a alma engrandece pormenores que habitualmente são banais. Contam-se os dias para as férias na terra e as memórias de Portugal são diárias, seja da família que por lá ficou, dos amigos, das folias, ou mesmo do frio gélido do Inverno e do sufocante bafo quente do Verão.
E comida? Aí comida! Não há como a da nossa terra.
Os produtos, os sabores e o cheiro dos petiscos da minha avó, tão simples e tão difíceis de recriar, fontes de inspiração de toda uma vida e lembranças que transporto até hoje.
Já das festas e romarias recordo o algodão doce, tecido com delicados fios de açúcar, leves e fofos, que numa época onde a falta de dinheiro para comida muitas vezes pontuava era um verdadeiro luxo. Foram as dificuldades que nos fizeram partir, mas o amor nunca faltou e sempre existiu em abundância talvez por isso as saudades fossem tantas.
Da minha passagem pela Suíça guardo para sempre a lembrança da colorida beleza das colinas verdejantes onde pastavam vacas felizes, cujo som do chocalhar dos sinos conservarei para sempre vivo. Recordo ainda a atracão imediata que senti pela enorme diversidade de doces tradicionais, particularmente pelos "caramel a la creme e beurre Salé", um doce artesanal, marcante pela simplicidade.
Os meus primeiros passos na cozinha foram de literal perseguição à minha mãe, sobretudo quando chegava da escola e observava a azafama dos preparativos para o jantar. Foi uma espécie de cozinha experimental nem sempre bem sucedida, apoderava-me de todos os ingredientes que apanhava a jeito e misturava-os sem grande critério .
De lá para cá fui-me cultivando, selecionando produtos, aperfeiçoando as técnicas, refinando o palato e acrescentando estórias à minha história como pessoa, como profissional.
Convido-vos a descobrir...As Memorias da minha Infância.